Esta
semana foi comentado, de forma pejorativa, sobre o MST e percebi que,
de certa forma houve uma certa concordância entre os colegas da
sala. Como não me posicionei no momento da aula, em função de
sempre gerar apenas um ou dois comentários de minha parte e o
professor tem o monopólio da palavra, resolvi escrever este pequeno
texto que enviei para todos os contato do Curso de Direito para fazer um contraponto.
Primeiro,
gostaria de deixar claro que demorei muito tempo para entender a
importância do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST),
justamente pela falta do conhecimento que me foi negado pelo banco da
escola e pelos meios de comunicações.
Segundo,
sou filho de agricultor e conheço bem a falta de política pública
brasileira para manter o homem no campo e forçar o êxodo rural para
formar o chamado “exército industrial de reserva” para garantir mão-de-obra barata nas cidades. Também tenho conhecimento de causa,
que me permite argumentar, que muitas vezes a renda gerada gerada na
propriedade não é suficiente para comprar novas propriedades para
os filhos que chegam na idade adulta.
Terceiro,
para a imensa maioria dos estudantes foi negligenciado como se deu a
distribuição de terras em nosso país. Hoje temos a maior
concentração de terras do mundo. Em nosso território, estão os
maiores latifúndios. Concentração e improdutividade possuem raízes
históricas, que remontam ao início da ocupação portuguesa neste
território no século 16. Combinada com a monocultura para
exportação e a escravidão, a forma de ocupação de nossas terras
pelos portugueses estabeleceu as raízes da desigualdade social que
atinge o Brasil até os dias de hoje. Grande parte da Europa
resolvera o seu problema com a expansão agrícola em outros
continentes. A exportação da sua mão-de-obra agrícola para os
outros continentes resolveu grande parte do conflito agrário no
velho continente.
No
Brasil, ainda nos anos de 1850, o Império decretou a lei conhecida
como Lei de Terras, que consolidou a perversa concentração
fundiária. É nela que se encontra a origem de uma prática trivial
do latifúndio brasileiro: a grilagem de terras – ou a apropriação
de terras devolutas através de documentação forjada – que
regulamentou e consolidou o modelo da grande propriedade rural e
formalizou as bases para a desigualdade social e territorial que hoje
conhecemos.
Nos
países centrais do sistema capitalista, a democratização do acesso
à terra, a reforma agrária, foi uma das principais políticas para
destravar o desenvolvimento social e econômico, produzindo matéria
prima para a nascente indústria moderna e alimentos para seus
operários, mesmo em pleno século XX os países europeus instituíram
política agrária para evitar a concentração.
No
Brasil com exceção da colonização a colonização das áreas
litorâneas e da europeia do século XIX e início do Século XX, que
ocuparam terras de difícil acesso, que foram distribuídos em
pequenas propriedades, temos as grandes propriedades rurais.
As
grandes propriedades rurais eram tocadas, principalmente pelos
meeiros e trabalhadores que viviam como agregados dentro das fazendas
(os caboclos). Não eram empregados das fazendas, apenas ocupavam uma
pequena porção de terra e estavam à disposição do dono ou
arrendatários das terras, para trabalhar no período da safra.
UmaOcorre
que com o processo de mecanização da agricultura este grupo de
pessoa passou a ser dispensado, não havia mais necessidade de seu
trabalho, não restando outra possibilidade a não ser engrossar a
massa de trabalhadores das áreas urbanas. Como este grupo (os
agregados) apenas ocupava uma pequena área da fazenda e a casa
geralmente era cedida pelo dono da fazenda fez com que este sujeito
buscasse qualquer alternativa, inclusive morar em barracos
improvisados.
Citei
estes fatos acima porque entendo que sem o mínimo de reflexão sobre
as condições e a realidade do nosso povo nós tornamos massa de
manobra para atingir outros interesses que não estão aparente. Tudo
faz parte de uma narrativa construída para legitimar a política da
exclusão social e da aceitação natural da concentração da posse
e da renda.
O
MST inicia com um movimento de mais de 500 famílias de agricultores
que viviam no Alto Uruguai como pequenos arrendatários, posseiros da
área indígena, peões, diaristas, meeiros, agregados, parceiros,
etc. que diante da falta de política pública queriam resistir ao
abandonar o campo.
Então
em 1984, os trabalhadores rurais que organizavam essas se reuniram no
1° Encontro Nacional, em Cascavel, no Paraná, e decidiram fundar um
movimento nacional, o MST, com três objetivos principais: lutar pela
terra, lutar pela reforma agrária e lutar por mudanças sociais no
país.
Este
movimento junto com outras organizações contribuiu de forma
decisiva na construção da nova constituinte, aprovada em 1988,
conseguindo com a materialização dos artigos 184 e 186, que
garantem a desapropriação de terras que não cumpram sua função
social.
Art.
186 - A função social é cumprida quando a propriedade rural
atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência
estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:
I - aproveitamento racional e adequado;
II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
I - aproveitamento racional e adequado;
II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;
III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;
IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.
Outro
fato que considero importante, que muitas vezes passa de forma
desapercebida no senso comum, ou é simplesmente negligenciada, é
que no Brasil, a agricultura familiar é responsável por 70%
dos alimentos
que estão nas mesas dos brasileiros e emprega 77%
das pessoas envolvidas com o setor agrícola, mesmo
com
um financiamento público que não deve chegar a R$ 30 bilhões
contra mais de R$ 190 bilhões para o agronegócio em 2018. Dito
isso, quando se fazemos discurso só criminalizando o MST estamos
também contribuindo para o discurso mercadológico e contribuindo
para negligenciar outras possibilidades de desenvolvimento social.